Maybe.


- Alô? - Alfonso falou completamente drogue. Havia acabado de chegar em casa e estava começando a pegar no sono.
- Oi - Dulce estava alegre, por incrível que pudesse parecer. - Te acordei, como sempre?
- Algo assim - ele esfregou os olhos e levantou da cama, deixando a namorada dormir tranquilamente. - Eu praticamente acabei de chegar do aeroporto.
- Onde você estava? - ela queria saber por que ele não atendera na primeira ligação.
- Colômbia - ele falou como se fosse óbvio. - Tudo bom?
- Você sabe que dia é hoje? - a voz dela era alta. Alta demais.
- Dezoito de dezembro. Onze anos, né?
- Sem o 'né', você sabe exatamente quantos anos são - ele revirou os olhos. - Você não pode sair daí? - Poncho franziu a testa um pouco, ela nunca fazia o pedido assim, na lata.
- O que você está fazendo?
- Nada - ele escutou um tilintar e sorriu, divertido. - Estou em casa, só isso.
- Quantas taças?
- Muitas - ela deu de ombros, ainda que ele não pudesse ver. - A cafeína estava me deixando muito agitada, então passei pro vinho. Eu tinha esperanças de dormir antes que desse meia-noite.
- Você não muda em nada.
- Ou talvez você me conheça muito bem. São onze anos, sabe?
- É estranho, agora que você está falando, eu querer voltar no tempo?
- Acho que não - ela mordeu o cantinho de um dedo, havia uma pele ali que estava incomodando. - Talvez eu não quisesse ter 17 anos outra vez, mas foi muito bom.
- Você está começando a ficar melancólica. Talvez eu prefira a Dulce alegre.
- Alegre normal ou alegre pela bebid... Ai! Eu tenho que parar de cutucar minhas unhas - ela fez uma careta, esperando a dor da pele arrancada passar.
- Suas unhas ficam ótimas sem que você precise comê-las.
- Eu sei, mas é mais forte que eu. E você pode tirar o celular da orelha, por favor? Eu liguei o FaceTime e não preciso ver seu tímpano - Alfonso afastou o celular do rosto, colocando-o de frente seus olhos.
- Você está linda - ele não conseguiu segurar o comentário.
- Linda? - ela indagou. - Minha maquiagem está borrada, meu cabelo... - ela o jogou para um lado.
- Está lindo. Eu gosto dele assim, ainda que o vermelho não seja minha cor favorita.
- Ele já faz parte de mim, ele me define.
- Sim, mas sempre que está nessa cor eu não gosto muito da definição.
- Sei... - ela começou a empurrar a bochecha com a língua. - Sem chances de você vir aqui?
- Sem chances - ele disse de uma vez. - Já tem um tempo que não comemoramos essa data, então não fique sentimental demais.
- Você é chato, Poncho, muito chato.
- Eu sei, pequena.
Dulce fechou os olhos e mordeu o lábio. De todas as formas que ele poderia chamá-la, aquela era a que mais doía. Ela se deixou transportar para o passado, relembrando beijos escondidos, fugas em quartos de hotel, camisas roubadas, carícias secretas. Aquele apelido não queria dizer apenas o seu tamanho, ou a falta dele. Ele dizia sobre amor, inocência, cumplicidade, companheirismo. Tudo que ela não tinha agora.
- Okay, desculpa, mas é força do hábito.
- De dizê-lo ou de me chamar assim? - ela abriu os olhos.
- Chamar você assim - ele deu de ombros, como se não fosse importante. - Sai pra lá, Tulia!
- A cachorra?
- Uhum - Dulce revirou os olhos, de raiva.
- Acho que vou deixar você dormir então - Poncho podia vê-la encher outra taça de vinho. Não deu muito, a garrafa estava praticamente vazia.
- Para de beber, ardilla.
- Esse é um apelido mais neutro - ela piscou, virando o vinho em um gole só. - E me deixe beber em paz. Você não pode controlar mais o que eu faço, você deixou isso bem claro da última vez que nos falamos.
Poncho tragou a saliva. Ela continuava sendo a mesma teimosa e orgulhosa de sempre.
- Boa noite então.
- Espera! - ele gritou ao vê-la com o dedo na tela do celular, pronta para encerrar a chamada. - Posso dizer?
- Não, você não pode - ela bufou. - Qual é o sentido disso tudo? Me deixa em paz então, se sua vida está dando tão certo.
- Foi você quem me ligou - ele lembrou. - É sempre você quem liga.
- Porque você sempre me dá esperança, como dizer isso que você quer.
- Eu não posso dizer as palavras exatas, Dulce, você sabe disso.
- Eu não sei de nada - ela cruzou os braços. - Feliz dezoito de dezembro pra você, Poncho.
- Feliz dezoito de dezembro pra você também, Dulce - ele sorriu com o bico que ela fez. - Três palavras - ele piscou.
- Duas - ela sorriu e jogou um beijo antes de desligar.
Talvez, pudesse haver um futuro.

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