Incertezas.


- Alô? - ele atendeu o telefone rapidamente e por um instante arrependi de ter ligado.
- Oi - respondi, com a voz baixa. Queria uma conversa normal, de amenidades, de felicitações por tudo que tem acontecido na vida dele, era melhor manter um tom neutro.
- Oi, ardilla - ele disse e eu sabia que havia sorrido.
- Como você está?
- Bem e você?
Pela segunda vez, em menos de um minuto, me arrependi de ter ligado. A conversa não parecia ser nossa, estava cordial demais, ainda que fosse como eu queria manter. O problema é que era nós dois, e cordialidade nunca foi muito o nosso forte.
Ele riu, talvez percebendo o mesmo que eu. Porém, depois da risada, o silêncio prevaleceu, nenhum dos dois sabia como continuar. Minha respiração começou a acelerar e isso era tudo que ele escutava.
- Hey - ele chamou, finalmente quebrando o silêncio. - Não precisa de tanta formalidade, somos nós - ele falou com a voz doce e isso me incentivou a continuar.
- É que é tão estranho. Já faz tanto tempo desde que nos falamos da última vez, nossa vida mudou tanto, que nem sei como conversar com você.
- Você deve ter ligado por algum motivo, não? Comece por aí.
Respirei fundo antes de falar.
- Eu estava procurando uma foto pra postar no Instagram ontem, passei por uma nossa e lembrei de você.
- É um começo - ele respondeu. - Qual foto?
- Você segurava minha bochecha.
- Talvez seja o tipo de foto que mais temos juntos - ele riu. - Pode especificar um pouco?
- Era antiga, meu cabelo estava vermelho…
- O que não quer dizer muita coisa - ele me interrompeu. - Você voltou a pintar o cabelo recentemente.
- Pode ser, mas você não apertou minhas bochechas recentemente e tiramos uma foto.
- Verdade. E já percebi que você está enrolando, mas okay. Por que não postou?
- Porque postar uma foto de Mai, Zô e Sam é pisar em um território mais neutro.
- Exceto pela data da foto - ele riu. Em tanta coisa para notar, ele tinha que perceber aqueles números tão pequenos? Resolvi e ignorar e fiquei em silêncio. - Você está linda, sabia? A casa dos trinta estão te fazendo muito bem.
- Você também não está nada mal - ri.
- É sério, ardilla. E eu gosto do seu cabelo dessa cor.
- Vermelho nunca foi seu preferido.
- Não pela cor, mas pelo que ela faz com você - ele suspirou, provavelmente pensando na Dulce ruiva. - Vi que saiu na capa da Glamour, as fotos ficaram ótimas!
- Obrigada, gostei bastante também.
- E se antes você parecia muito com Blanca, hoje você consegue parecer com Claudia na mesma medida. Acho que são suas sobrancelhas.
- Que coisa estranha para se falar.
- A verdade, só isso.
- Okay… - novamente eu não sabia o que falar, mas ele parecia levar a conversa bem, ainda que tenha sido eu a ter ligado.
- Você não me ligou em dezembro.
Era verdade. Desde que acabou nossa convivência 24/7, eu ligo para ele todo 18 de dezembro. Hoje em dia nós nos falamos muito pouco, às vezes só uma mensagem de feliz aniversário ou algo assim, porém no dia 18 de dezembro eu me obrigo a ligar. Eu não sei o que Poncho ainda significa na minha vida e, sinceramente, nem quero saber. Sei que ele é importante e isso basta. Por muito tempo não bastou, talvez seja por isso que ao longo dos anos continuamos nos encontrando às escondidas, mas isso não acontece há muito tempo também. O que quer que significávamos um para o outro, era muito forte, mais do que podíamos - ou sabíamos - lidar. E aí percebemos que nunca daríamos certo juntos. Ele costumava dizer que era o fogo e eu a água, que sempre o apagava, e que, por fim, era impossível coexistirmos lado a lado. Foi então que decidimos seguir com nossas vidas. Só que, como eu disse, ele é importante demais para que eu deixe a distância acabar com o que construímos. Por isso eu ligo dia 18 de dezembro, por isso essa é uma data extinguida do meu calendário normal, uma data que existe apenas em um mundo paralelo em que Dulce e Poncho são os personagens principais.
Só que o último 18 eu simplesmente não consegui. Ele teve um filho no ano passado e isso mexeu comigo, isso mexeu com a Dulce do mundo paralelo. Um filho muda tudo, tudo mesmo. Um filho é sagrado demais para essa brincadeira, ou sei lá o que seja, que ainda fazemos um com o outro. Eu queria poder explicar isso a ele, mas colocar em voz alta, tirar da minha cabeça, parece loucura demais. Esperava que ele entendesse, mas também já tem tempo que ele não convive comigo, talvez já não me conheça mais.
- É, não liguei - foi tudo que consegui dizer.
- Você está bem, Dul? - percebi que não era ardilla mais.
- Estou sim, é só que… - respirei fundo, pensando em como dizer. - As coisas mudaram.
- Um pouco - eu podia até mesmo ver ele dando de ombros, como se tudo aquilo fosse algo banal. - Mas somos Dulce e Poncho, não tem o que a gente não consiga resolver.
- Não? - perguntei. A gente nunca conseguiu nos resolver, porque se sim, tudo seria bem diferente.
- Talvez tenha - ele deu uma risadinha.
- Eu não liguei para falar disso, e nem quero - falei logo. - Só queria saber como você está, a sua vida, o seu filho.
- Estamos ótimos! - eu sentia orgulho em sua voz. - Você tem que conhecer o Dan um dia, ele é a criança mais linda desse mundo.
- Sempre são - sorri. Discutir com um pai a beleza de seu filho sempre não leva a nada, é melhor concordar. - Fico feliz que você está feliz.
- Obrigado - sua voz era tenra.
- Não vou ficar te alugando por mais tempo, depois a gente combina de se encontrar para eu conhecer o pequeno.
- Tudo bem. Boa sorte no show esse mês, não sei se nos falaremos até lá, então…
- Obrigada. E boa sorte em tudo que estiver fazendo também.
- Uhum.
E o silêncio prevaleceu outra vez. Não sabíamos como nos despedir, o que sempre dizíamos parecia uma traição se dito agora, logo depois de falar do filho dele. Respirei audivelmente enquanto pensava no que fazer, até que ele falou primeiro.
- Três palavras, pequena.
- Duas - sorri, vendo que, apesar de tudo, nada de fato mudara, e nós desligamos o telefone.

2 comentários

  1. "- Oi, ardilla - ele disse e eu sabia que havia sorrido." :( que saudade desse apelido

    "Não precisa de tanta formalidade, somos nós" PQP

    "- Você deve ter ligado por algum motivo, não? Comece por aí." virginiano uahuahauahaua

    "mas você não apertou minhas bochechas recentemente" nossa, pra quê isso, Ágatha???/??????

    "Você está linda, sabia?" CATAPLOFT :(

    "Ele costumava dizer que era o fogo e eu a água, que sempre o apagava, e que, por fim, era impossível coexistirmos lado a lado." <3 <3 e nunca vai mudar

    obrigada <3

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  2. "- Oi, ardilla - ele disse e eu sabia que havia sorrido." :( que saudade desse apelido

    "Não precisa de tanta formalidade, somos nós" PQP

    "- Você deve ter ligado por algum motivo, não? Comece por aí." virginiano uahuahauahaua

    "mas você não apertou minhas bochechas recentemente" nossa, pra quê isso, Ágatha???/??????

    "Você está linda, sabia?" CATAPLOFT :(

    "Ele costumava dizer que era o fogo e eu a água, que sempre o apagava, e que, por fim, era impossível coexistirmos lado a lado." <3

    "uma data que existe apenas em um mundo paralelo em que Dulce e Poncho são os personagens principais" melhor frase de todas, você é má demais uahauha

    "apesar de tudo, nada de fato mudara" <3 e nunca vai mudar

    obrigada <3

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