Magic.


Ela mexia as perninhas, enquanto olhava para o móbile dependurado em seu berço. Bruna encarava aqueles unicórnios que balançavam e brilhavam conforme a luz batia. Eles eram transparentes, mas havia momentos que pareciam ter todas as cores do arco-íris. Ela esticou um bracinho na esperança de alcançá-los, mas eles estavam muito distantes. Então ela começou a se sentir entediada, a casa estava em completo silêncio e não havia nada para fazer.
- Gustavo - Letícia chamou ouvindo aquele chorinho. Ela havia se acostumado tão rápido que no primeiro uém já acordava. - Gustavo, hoje é sua vez - ela o cutucou com o cotovelo.
- O berço está mais próximo de você - ele resmungou.
Despreparados com o nascimento repentino da criança, Letícia e Gustavo tinham pouca coisa: uma banheira jogada em algum canto, duas mamadeiras, um berço ao lado da cama, alguns produtos de higiene, roupinhas e muita fralda. O móbile de unicórnios havia sido presente de Thais e às vezes acalmava até mesmo Letícia.
Já havia se passado cinco meses desde o nascimento e eles mesmos não quiseram fazer muita coisa. A relação ainda era confusa, Letícia apenas o considerava como namorado, ainda que agora ele dormisse com ela todos os dias. Ou quase todos, ele ia em casa uma vez por semana ou algo assim. O apartamento era pequeno para uma família, quando Letícia o comprou ela pensava apenas em si e talvez um cachorro. Seu quarto era grande, no entanto a sala, a cozinha e o cômodo onde tinha uma cômoda com as coisas de Bruna não. Ela cabia perfeitamente ali, mas não Gustavo, que era espaçoso, e Bruna, que precisava de um quarto e aquisições decentes.
Ela sentou na cama calmamente e ficou encarando a filha chorar. Bruna ainda era tão pequena que às vezes assustava, Letícia tinha medo que pudesse quebrar algum ossinho sempre que a pegava. Agora ela era considerada como um bebê de um mês, porém já fazia bem mais que isso que Letícia a via ali, no mundo real, e assim tudo parecia errado devido ao tamanho.
- Ei, baby girl - ela disse. Apesar de prematura, Bruna era bem esperta. Ela logo cessou o choro e ficou procurando de onde vinha a voz, até que viu Letícia. Talvez fosse um sorriso, talvez apenas gases, mas a expressão dela era encantadora. - O que você quer? Está com fome? - ela esticou o braço para cima e Letícia a pegou.
No início Bruna tomava apenas fórmula, mas agora Letícia já tinha leite e intercalava entre os dois. Ela recostou na cabeceira da cama, abriu o sutiã e começou a amamentar a filha. Ainda que fosse pequena, Bruna era bem esfomeada.
- Viu, não adiantaria eu pegá-la - Gustavo disse se virando para as duas.
- Você me deve, Gustavo - Letícia segurava a mão pequena da filha.
- Depois você desconta - ele pegou no pé de Bruna. - Quando a gente vai mudar?
- Mudar? - Letícia o encarou. - O que você quer dizer?
- Nós ficaremos assim até quando? Eu moro aqui. Nós temos um bebê. Em algum momento ela vai crescer e esse berço virará uma cama.
- Gu...
- A gente tem que começar a pensar nisso. Ela tem que ter um quarto e mais que duas mamadeiras.
- Sim, eu concordo. Mas... E eu e você?
- O que tem a gente? - Gustavo riu. Ela era encantadora quando nervosa. - Você escolhe o mês do casamento.
- Casamento?! Calma. Eu sei que a gente já está no último passo, mas não é assim. Casamento é coisa séria.
- E filho não? - ele fez uma careta.
- A gente acabou de se acertar. Nós estamos namorando, eu acho.
- Sim, estamos.
- E agora você está meio que morando aqui.
- Sim.
- Nós vemos se dará certo e depois pensamos num apartamento grande e num...
- Casamento.
- Isso.
- Podíamos pelo menos ir para o meu apartamento. Ele é maior que o seu.
- Eu gosto daqui, apesar de pequeno.
- Eu sei, eu também gosto, aqui é aconchegante. E a sua varanda é maior que a minha.
- Okay, pensarei a respeito - Letícia voltou a atenção à Bruna que parara de mamar. - Você escutou seu pai, filha? Ele quer casar.
- Você também quer, só não se deu conta - ele observava as duas.
- Você quer um quarto grande? - Letícia a tinha de frente a si, apoiada em suas pernas. - Você quer dormir sozinha? - a menina piscava franzindo a testa. - Você é um bebê unicórnio, sabia?
- Ahn?! - Gustavo, que já havia fechado os olhos, as encarou. - Bebê unicórnio?
- Uhum - Letícia assentiu com a cabeça, esboçando um sorriso. - Ela é mágica, assim como um unicórnio. E é feita apenas de coisas boas - e então Bruna deu uma risada. Ou talvez fosse apenas um arroto.

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