There's just too much that time cannot erase


Ela olhou em volta e riu com a bagunça. Cuidar de uma criança era muito mais difícil do que pensara. Principalmente sua sobrinha, que já era uma peste. Por que diabos disse que passaria o dia com a menina? Por que a amava, e por mais que fosse bagunceira, nada disso importava. Ela suspirou fundo, e se perguntou quando sua vida chegaria o mais próxima da da irmã.
- Clara, vem aqui.
- Mas agora é a Galinha Pintadinha, titi Dulce! - a menina ainda não havia completado seus 4 anos, mas já era uma tagarela. - Você vai cantar comigo?
- Eu vou preparar o almoço, o que você acha? - a menina fez uma careta e se virou para a televisão outra vez.

Dulce seguiu para a cozinha com um sorriso no rosto. Sua vida estava ótima, com exceção das idas e vindas no namoro. O problema é que ela já havia completado seus 30 anos, e a vontade de formar uma família gritava dentro de si. Ela sempre quis isso, mas não imaginava que quando chegasse certa idade praticamente imploraria. Talvez fosse esse o motivo de perdurar o namoro com Rodrigo, mesmo já não sendo a mesma coisa de três anos antes. E esse era o seu namoro mais longe, com exceção de Daniel, é claro. Mas naquela época ambos era tão imaturos e mais amigos que qualquer coisa, que os beijos, os planos para o futuro, eram inocentes demais.
Ela estava quase terminando suas mágicas na cozinha, que por sinal eram ótimas, tudo aprendido com o namorado, quando a campainha tocou. Antes que pudesse atender, Clara já o havia feito.
- Já te falei para deixar que eu abra a porta, Clara - ela recriminou a sobrinha enquanto dava um abraço em Ivalu. - Podia ser alguma pessoa má.
- Mas a Iva não é má - a menina franziu as sobrancelhas.
- Você que pensa - Dulce riu enquanto fechava a porta. - A que devo a honra?
- Vim te confirmar minhas suspeitas - Ivalu deu de ombros e Dulce arregalou os olhos.
- Sério?!
- Sério - e ela foi envolvida por um abraço de urso.
- Parabéns, amiga! Que coisa mais linda!
- É, eu sei - as duas foram para a cozinha enquanto Clara continuava a assistir à Galinha Pintadinha. - Estava na hora, né? Daqui a pouco faço 40.
- Ah, mas você aproveitou muuuito bem o casamento, e agora chegou a hora. Já sabe de quanto tempo?
- Seis semanas. E aqui está meu feijãozinho - ela balançou um pequeno papel que Dulce correu para ver.
- Realmente parece um feijão - ela fez língua. - Estou muito feliz por você, de verdade.
- Eu sei - Ivalu sorriu, sincera. - Um dia chegará a sua vez.
- Só eu que não sei quando - Dulce bufou, desligando o fogão. - Clara, vem almoçar! Quer comer com a gente?
- Não, Pedro está vindo me buscar. Ele disse que ia demorar, então saí do consultório e vim aqui.
- Ele já sabe?
- Aham.
- Ele te mataria se contasse primeiro à mim. Clara!
- Ela não gosta muito de comer, né? - Dulce negou com a cabeça.
- Só porcaria e massas. Pode reparar que está bem gordinha. Claaaraaa!
- To aqui - a menina fez um esforço para se sentar ao balcão e Ivalu a ajudou. - Só um pouquinho, ta? - Dulce piscou e colocou o prato frente à menina.
Com menos de cinco minutos Ivalu foi embora, deixando Dulce e Clara almoçando. Depois de arrumar toda a cozinha, ambas deitaram no quarto, logo Clara já estava dormindo. Dulce, mesmo sonolenta, mexia no celular. Então chegou uma mensagem.
Estava arrumando algumas coisas e achei outras bem velhas. Senti sua falta, ardilla barrilete.
Ela sorriu. Ele ainda a chamava daquele jeito.
Posso saber quais coisas, ardilla papa?
Aqueles apelidos faziam parte de um passado muito distante. E, mesmo que de um passado muito doloroso, era o mais lindo.
Um álbum de fotos bem raras que ganhei de uma ruiva que eu adoro.
Dulce olhou para aquele cabelo desbotado, com uma cor completamente indefinida, e lembrou que independente de como ela estava, ele sempre a chamava de ruiva.
Na verdade, uma caixinha com tudo o que diz respeito à essa ruiva.
Sério que você vai olhar isso agora? ela perguntou, abismada. Nunca tocava na caixa onde continha todas as cartas, presentes e fotos que ambos trocaram ao longo do namoro e da amizade. Era doloroso demais.
Qual é o problema? ele perguntou.
Ah, hoje tudo é diferente.
Não posso mudar o passado. Mas posso recordá-lo.
Sinta-se à vontade.
O que você está fazendo?
Ela enviou uma foto. Deitada na cama e Clara com a cabeça em sua  barriga.
Ela, definitivamente, é a sua cara.
Todos dizem, haha.
Se eu não soubesse que é da Claudia, diria que você engravidou de alguma forma.
Esse dia não chegará tão cedo.
Uuu, ainda pensa assim?
Na verdade não. Mas não quero uma produção independente.
E o namorado?
Ele é ótimo, mas não nos damos mais certo como antigamente.
Uma pena.
É.
Ambos ficaram em silêncio por um tempo.
Você se lembra quando fomos para Acapulco?
Qual de tantas vezes? HAHAHAHA.
Um ano de namoro.
Dul?
Estou aqui. ela demorara a responder. Lembro sim. Nós fomos à praia, jantamos em um lugar super legal, eu escrevi uma carta que na época achei linda, e no fim você me desflorou.
HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA. Você é tão engraçada. E a carta é bonita sim, estou lendo-a agora.
PARA COM ISSO! Que vergonha, Poncho.
Essa é você, então não se envergonhe.
Eu era uma idiota que escreveu coisas idiotas. Algo como "eu te amo e estou pronta para dar um passo a mais." Sim, eu lembro.
Achei que sua memória era bem ruim.
Ela é! Mas eu lembro dessa carta, particularmente.
:O Tem umas partes que se parecem muito com uma música sua.
É, eu sei disso também. ela fechou os olhos fortemente. De verdade que você vai ficar lembrando essas coisas?
Você nunca o faz?
Tento, pelo menos.
Eles ficaram em silêncio outra vez. Durou cinco minutos inteiros.
Às vezes eu sinto a sua falta. De como você sempre que podia me dava uma flor pela manhã, como reclamava da minha mania de mexer no piercing do nariz, dos seus planos absurdos para o futuro, dos coques mal feitos no meu cabelo depois de uma noite agitada, do seu carinho quando minha bronquite atacava, das três palavras na hora de dormir, dos seus cachos. ela enviou e logo já começou a digitar mais.
Porém hoje tudo é diferente, nós temos outras pessoas na nossa vida. E já se passou tanto tempo desde a última vez que estivemos juntos, que não tenho mais esperança que isso aconteça de novo. E, talvez, seja melhor assim.
Você sempre será o meu amor maior, Poncho, mesmo que nossos caminhos não sejam entrelaçados.
Ele demorou para respondê-la. Mas ela não se arrependeu das mensagens, sempre que tinha a oportunidade, sempre que suas conversas voltavam ao passado que compartilhavam, ela dizia aquilo a ele, ainda que com outras palavras a cada vez.
Você sempre será a minha ardilla, sabe disso. Mesmo que hoje eu tenha outro animal comigo. Isso não soou bem, mas você entendeu.
É, eu entendi, haha. Quem diria que você teria cachorros?! Mas eu fico feliz por você ter encontrado alguém legal e estar feliz com ela.
Eu também estou.
:)
- Oi? - ele atendeu a chamada de vídeo e viu uma menina sapeca na tela do celular. - Oi, Clara.
- Oi - ela sorriu, ainda sonolenta. - Poncho, não é? - ele assentiu com a cabeça. - Eu não lembro muito de você.
- Você já o viu nos dvds, Clara - ele escutou a voz de Dulce, já que podia ver apenas a barriga dela por trás da menina.
- Eu sei, mas falo a pessoa dele.
- Pessoalmente, você quer dizer - a menina balançou a cabeça assentindo.
- Você era mais nova quando me viu, Clara, já tem muito tempo. Acho que pouco depois que fez dois anos.
- Tem tanto tempo assim que não nos vemos? - Dulce perguntou.
- Por aí - ele respondeu. - Sua tia está se comportando, Clara?
- Ela sim - a menina fez língua, quase gargalhando. - Eu vou desligar que a titi Dul ta com uma cara muito feia.
- É porque a senhorita não dormiu nem meia-hora! - Dulce respondeu.
- Você me acordou se remexendo na cama - a menina fingiu sabedoria. - Poncho, até outro dia..
- Até mais, Clara - ele sorriu. Tchau, Dulce.
- Tchau - ela também sorriu enquanto respondia, então Clara desligou. - Fica deitada um pouco, meu amor? Eu vou arrumar a bagunça que você fez na casa.
- Eu tenho que dormir?
- Não se você não quiser. Mas fica aqui um pouco. Eu ligo a televisão.
- O que você vai pôr pra eu assistir?
- O que você quiser, menos a Galinha Pintadinha.
Clara colocou um dedo na boca, pensando.
- Posso ver um dvd seu?
- Qual?
- Um que você ta com uma bota até aqui - ela mostrou em sua própria perna. - E o cabelo bem cacheado e uma franjinha assim - Dulce forçou a memória para tentar lembrar. - Você ta com um vestido dessa cor - Clara apontou para os escritos da blusa de Dulce.
- Já sei qual é - Dulce levantou e abriu uma gaveta cheia de dvds para então colocá-lo no aparelho e ligar a televisão. - Fica aí assistindo e qualquer coisa é só me chamar.
- Titi Dul? - Dulce, que já estava na porta do quarto, se virou para a sobrinha. - Você já namorou o Poncho?
- Por que diz isso?
- Tem uma foto sua e dele aqui no telefone igual tem sua com o Rodigo - ela não conseguia pronunciar o 'd' e o 'r' juntos - Dulce havia se esquecido completamente do celular na mão da menina.
- Já sim, Clara, mas isso foi há muito tempo. Hoje eu estou com o Rodrigo, okay?
- Okay - a menina a ignorou assim que a primeira música começou a tocar na televisão e Dulce sorriu ao ir para a sala.

2 comentários

  1. mensagens <3
    Clarita gordita! <3
    Iva e o bebê! <3

    Rodrigo vai durar até os 30? #sofre hahaha

    essa magia ninguém tem igual <3 mesmo que nunca acabe do jeito que deveria (para gente, talvez para eles deva mesmo ser assim, anyway...)

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    Respostas
    1. Não faço nem ideia, mas vai que dura.

      e não adianta, eles se amam. asuhasuhauaus

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