Fear.

Letícia acordou incomodada naquela quarta-feira. Ela teve um pesadelo horrível e, ao olhar para o lado, constatou que Gustavo não estava ali. Ela queria apenas um abraço apertado e ele dizendo que tudo ficaria bem. O barulho da água caindo a fez perceber que Gustavo não havia ido embora.

- Já acordou? - ele perguntou quando ela entrou no banheiro.

- Tive um pesadelo.
- Você está legal? Quer falar sobre isso?

- Não - ela passou a mão embaixo dos olhos, como se limpasse uma maquiagem borrada. - Você vai ficar aqui hoje? - ela se apoiou na pia.

- Tenho que resolver um monte de coisas. Você vai ficar bem? - Letícia deu de ombros.

Já estava na vigésima quarta semana da gravidez, mas a relação deles ainda a incomodava. Eles não assumiram um namoro, eles não casaram, eles não moravam juntos. Gustavo ia para o apartamento dela algumas vezes na semana e depois voltava para o seu próprio. Letícia usava sempre roupas largas para esconder a barriga enorme. No fim das contas eles tinham um bebê, mas nada mudara realmente.

Ela foi para cozinha preparar um bom café da manhã, estava morrendo de fome e esperava que não tivesse um desejo maluco. O que, é claro, não seria concretizado. Letícia entrou correndo no banheiro enquanto Gustavo desligava o chuveiro.

- O que você tentou comer dessa vez?

- Pão com linguiça - ela resmungou ao dar descarga. - Parece que ficar pior a cada dia - ela apenas gargarejou um pouco de água na boca.

- Você continua querendo comer carne de porco.

- Uhum - Letícia deitou na cama.

- Já deviam ter parado os desejos, não?

- Não sei - ela ficou de barriga para cima, pôs uma mão na testa e outra no ventre. - Eu acho que estou com febre.

- Sério? - Gustavo se aproximou e pôs a mão na testa dela. - Você está suando?

- Uhum - Letícia fechou os olhos e engoliu em seco. - Tem um termômetro no banheiro, pega lá.

Gustavo colocou o termômetro nela e foi se arrumando enquanto esperava o tempo certo. Quando o aparelho apitou, ele já tentava calçar o tênis.

- 39, merda - Letícia resmungou.

- Toma um banho mais frio, eu faço um chá pra você.

- Eu vou te atrasar - ela se levantou devagar.

- Vai lá, Letícia.

Ela deu apenas um passo e parou subitamente. Gustavo, que ia ao seu encontro para ajudá-la, parou também. O olhar de Letícia congelou, então ela arregalou os olhos e depois eles se encheram de lágrimas. Ela estava pronta para gritar e fraquejar as pernas quando Gustavo a segurou.

- Letícia, o que foi? O que você está sentindo? - ela ficou calada por alguns instantes, curvando nos braços dele. - Let!

- Gustavo... - ela respirou fundo e falou com a voz entrecortada. - Eu acho... Eu acho... - Letícia olhou para as pernas e viu seu short molhado. - Eu acho que a bolsa estourou.

'Cause there's just an empty space