Listen to your heart



- O que você está olhando? – ela me perguntou, de repente.
- Só as casas em volta – respondi, sem tirar os olhos da janela. – Sabe, Kath, acho que estou me tornando uma adulta – me virei para ela.
- Por que diz isso? – ela me respondeu sem tirar os olhos do trânsito.
- Não importa em que meio estou, vejo uma casa que me parece aconchegante e já me imagino lá dentro. Cada móvel no seu lugar, a cor das paredes, o cheiro na cozinha, eu andando por lá...
- Talvez esteja na hora de sair de casa.
- Pode ser, mas não é dessa forma – eu não sabia como explicar. – O meu cantinho, com ele, sabe? E tudo do meu jeito, como sempre quis que lá em casa fosse.
- Talvez você esteja se tornando uma adulta, Sam – sorri, e ela também. – Talvez você esteja pronta para esse passo, mesmo que isso inclua muitas outras coisas que seus desejos não mostram.
- A vida foi feita para arriscar, certo? – ela concordou com um balanço de cabeça. – Mas eu não tenho como sair de casa agora, Kath. Arrumar um lugar sai muito caro, e eu não tenho esse dinheiro – a realidade é dolorosa, as coisas nunca são como vemos nos filmes. – E nem ele.
- Talvez esteja na hora de você parar de brincar de casinha.
- É, talvez - voltei a olhar pela janela do carro.
Ela sempre disse isso de mim, como se minha vida toda fosse uma brincadeira. Mas eu não tenho culpa se sempre gostei de me divertir, em tudo. Não tive culpa quando escolhi minha faculdade e desisti no meio do curso, acho que esse sempre foi o ponto principal da brincadeira.
- Olha que gracinha – apontei sorrindo, uma criança por volta dos três anos atravessando a rua com a mãe que tinha um barrigão enorme.
- Como eu disse: parar de brincar de casinha – emburrei e cruzei os braços sobre o peito.
Isso também é brincar de casinha pra Kath: ter filhos, constituir uma família. Não que ela nunca queira, mas é que na nossa idade ela acha. Não é uma brincadeira, é só o meu maior sonho: ser mãe. Acho que desde que eu era uma adolescente com idade suficiente para entender todas as responsabilidades que um filho acarreta, eu queria o meu. Mas eu também não sou burra de engravidar agora, com um curso novo praticamente no início, morando na casa da minha família, sem um emprego realmente estável e solteira. Não que ter filho dependa de marido pra mim, mas eu escolhi o meu namorado a partir do momento que eu vi que era pra sempre.
- Samantha, a sua hora vai chegar, você só tem que correr atrás e esperar. Rimou – ela deu uma risadinha.
- E você, Katherine, o que quer da vida? Ta virando uma adulta como eu – ri.
- Não assim – ela fez um muxoxo. Fiquei esperando que continuasse. – Eu quero terminar a faculdade, começar a trabalhar e me estabilizar. Aí então eu vou procurar a sua principal felicidade.
- Sonhos diferentes, só isso – dei de ombros. – Eu quero terminar a faculdade também, ouviu? Trabalhar, ganhar um bom dinheiro que dê para pagar as minhas coisas... Mas não é a minha prioridade.
- Eu sei – ela disse em tom de censura. Mas eu não me importei, pra mim o que importa na vida é ser feliz. E eu estou, e ficarei ainda mais, do meu jeito, com os meus sonhos.

Um comentário

  1. Sempre que vejo alguma casa que acho bonita, anoto na minha cabeça a cor da parede ou o formato da janela, pensando no meu próprio canto. Ultimamente isso tem acontecido muito. Deve ser coisa da idade.

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